segunda-feira, 22 de fevereiro de 2010

O Porquê de uma Oferenda

  
   Existem muitas razões para se fazer uma oferenda mas no fundo o que está em causa é um sistema de troca. Frequentemente realizadas não apenas como retribuição por um favor mas também como garantia de que se será favorecido, as oferendas são grandemente questionadas, e com alguma razão, pelos mais racionalistas. 
   Perguntaram-me porque faço oferendas à Terra, Gaia, Deusa...  se sei que não me cai um raio em cima se não o fizer e que isso não impedirá a ocorrência de catástrofes. Respondi simplesmente: - Por educação!
   Sim, para mim é fundamentalmente uma questão de boa educação. Eu olho para o mundo e percebo que a minha existência tal como a de todos os seres vivos depende de como funciona aquilo a que chamamos Cosmos. Nesse momento de profundo esclarecimento em que me sinto tão ligada à Terra e ao Todo, sinto a mesma obrigação que se sente em dizer um "obrigado" a quem nos cede passagem, ou um "bom dia" a quem passa por nós sorridente, ou até de levar a chavena da esplanada para o balcão naquele café cujo o dono é tão simpático. São pequenas coisas que não mudam nada, nem prejudicam ninguém e que nos fazem sentir bem, então porque não fazê-las?
   Por outro lado sinto que as minhas oferendas são hipócritas se o meu estilo de vida não é minimamente ecológico, pelo que não é algo que faça de animo leve. Da mesma maneira que penso muito bem no que vou oferecer. Normalmente ofereço, alimentos, especiarias ou queimo simplesmente um pau de incenso numa noite em que me sinto estarrecida pelo luar. Nada de muito suptuoso, sacrificar grandes quantidades destes recursos seria um contra-senso, pois a produção destes bens também tem custos para a Natureza. Uma oferenda é para mim sempre um acto simbólico de partilha, que simultaneamente resulta e conduz à reflexão.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Survival International - manifesto a pretexto do Avatar


    A Survival é uma organização internacional que existe desde 1969 e se dedica ao apoio de povos tribais de todo o mundo, apostando na educação, no direito e em campanhas e constítui um suporte de divulgação essencial para estes povos. No seu site http://www.survivalinternational.org/ pode aceder a muita informação referente ao seu trabalho e até fazer um donativo.
  Hoje foi publicitada no www, programa da antena3, pela produção de um documentário  que chama a atenção para o facto de que todos se comovém com o Avatar mas, poucos sabem que todos os dias os interesses de grandes empresas e de políticos corruptos desalojam, descaracterizam, exploram e matam directa ou indirectamente seres humanos (http://www.survivalinternational.org/films/mine). 
    Sim, seres humanos, criaturas exactamente da mesma espécie animal que o leitor, exactamente com o mesmo grau de encefalização e consequente capacidade de pensar que sua excelência. Seres que tal como vós são possuidores de uma cosmologia, uma moral, costumes e uma estrutura social complexa com instituições. Seres que como sua excelência nasceram integrados numa sociedade ligada a um território que é seu por ocupação temporalmente bem superior ao uso capeão.
   "Um país não pode parar porque meia dúzia de gajos não querem mudar de casa!" nem me venham com este tipo de argumentos. Se a China quisesse comprar Portugal, dizendo-lhe que pode mudar-se para um bairro social qualquer, noutro lugar qualquer e que se não aceitar a sua casa será demolida e será forçado a abandonar o território, pois este foi comprado à União Europeia, o senhor queria fazer negócio? Pois... mas é assim que frequentemente a coisa funciona.
   As taxas de suicídio entre indígenas a trabalhar em plantações na Amazónia são elevadíssimas, sabe porquê? Porque o mundo deixou de fazer sentido para essas pessoas. Tal como no raio do filme dos nativos azuis, o mundo perdia o sentido quando se destruía a árvore dos espíritos. Se percebe no filme, porque raio não percebe no mundo real?
   Não sabia? Acontece, há muita gente que não quer que se saiba... Não é o único a estar ignorante. No estado do Vaticano um jornalista também perdeu tempo a criticar o filme Avatar por, segundo este senhor, representar uma falsa religião ligada à naturesa, toda a questão humanitária passou-lhe ao lado.
   Acha que a mensagem do filme até era mais ecológica? Tótó... então não vê que os problemas ambientais são problemas humanitários? Acha mesmo que os ambientalistas só querem um mundo mais bonito? Acorde para a vida.
   Se gosta de crianças, ou acha que um dia até vai querer ter filhos e netos e acha muito natural que estes também os venham a ter, então porque raio não se preocupa com a contaminação do ecossistema? Não vê que está a contaminar também os seus filhos, por exemplo, por via da alimentação?
   Também não sabia nada disto...? mais uma vez há muitos interessados em que não saiba... Mas agora já sabe. 
Agora já pode fazer alguma coisa!!!  

  

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

Jejum e religiosidade - os erros que cometi




   Perdoem-me um texto tão longo mas estou cansada de tentar encolhê-lo. Já tentei escrever este post de mil maneiras e nenhuma me sai bem. Não percebo o porquê de tanta dificuldade, afinal a mensagem é simples: cuidado com as obecessões, não usem a religiosidade como desculpa e motivação para um No Food ou uma iniciação sexual vazia de sentimentos e respeito por vocês próprios e pelos outros, cuidado com os sacríficios e as automutilações... Auto-iludida eu já fiz isso tudo, e de que me valeu? A deusa não me quiz, foi isso o que me valeu, não se pode servir a deusa doente. Os gregos tinham o lema "Mens Sana in Corpore Sano", juntemo-lhes o "Anima Sana".

- Por favor não cometam os erros que eu cometi!!!


   Desde criança havia em mim três fomes: a fome do espírito, a fome de aceitação social e a fome de alegria.

• A fome do espirito


   Que tola que eu fui em menosprezar-me, poucas pessoas fazem o que eu fiz e ainda menos com aquela idade. Quantas crianças debateram mentalmente o catolicismo, as injustiças do mundo e o espírito da natureza no recreio da escola primária? Quantas pessoas chegaram à pré adolescencia com as bases de uma lógica do universo formada? Quantas, quando numa pesquisa ocasional, descubriram que afinal havia uma religião semelhante, exitaram e tiveram a coragem de concluir que NÃO era a mesma coisa, voltando a ficar sós?

   Fiz tudo isto, e irónicamente a detestar filosofia..., mas continuei a detestar-me, a achar que nascera sem dons. À minha volta orbitávam esotéricos, pessoas que viam, sentiam e pressentiam coisas. E eu nada. Não via, não sentia e não era certamente um oráculo. Nem sequer era capaz de me entender com esses esotéricos que invejava, e tudo devido à minha terrível mania de pensar. Que burra que eu fui em não perceber que a minha capacidade para ver sempre em simultâneo o lado do crente e do racionalista e conjugá-los era o melhor que havia em mim


A fome de aceitação social


   Queria ser como as outras raparigas da minha idade, ter muitos amigos, um telemóvel que nunca pára, um corpo de mulher e rapazes que me desejassem (era assim que eu as via). Ter juizo e conversas inteligentes nunca me haviam trazido nada disso pelo que estava disposta a parar de pensar, de me instruir, enfim a estupidificar para vender-me a um modelo que apesar de tudo condenava, mas que atingido prometia aceitação.



A fome de alegria (luz própria)


   Por tudo isto e mais qualquer coisa que nunca soube identificar, desde criança que me sentia sempre profundamente infeliz. Quase todos os dias pensava que tinha todas as razões para ser feliz mas simplesmente não conseguia sê-lo, o porquê não sabia mas era certamente culpa minha. Invejava aqueles que tinham dores de verdade porque esses ao menos podiam queixar-se. E assim um dia com uma agulha arranhei a pele lentamente mimetizando os que se automutilavam apenas para o meu corpo ficar de acordo com o que sentia.




   Insaciável descobri na fome o remédio para estas outras fomes, um remédio venenoso que aos poucos e poucos adoeceu-me do corpo à alma e um dia podia ter-me morto.


   Não correspondo exactamente ao retrato de um anoréctica ou de uma bulimica o que é muito natural pois há muitos mais distúrbios alimentares além destes de que os media estão sempre a falar.

   O que me aconteceu foi simples, desde criança ouvira falar de pessoas que deixavam de comer para emagrecer, de pessoas que induziam o vómito, tomavam diuréticos, laxantes e estimulantes... e eu muito deliberadamente, a fim de perder a barriga, usei as suas técnicas porque, como mostrava a TV, resultavam. A primeira com resultados absolutos e as seguintes como remédio de emergência, métodos de compensação.

   Durante anos nunca pensei estar doente, achava que essas pessoas que via na TV não tinham consciência do que estavam a fazer nem do seu peso real. Eu tinha, eu sabia o que estava a fazer, não estava obcecada pela ideia de pesar 25kg, ficaria pelos 47, ou melhor, pelos 45, por uma questão de segurança. Nem tão pouco pensava que o meu sucesso profissional depende-se da minha aparência, ou que nunca viria a ser amada. Que um homem me amasse era perfeitamente possível quando fosse adulta, mas o prazer de suscitar paixões, esse ser-me-ia vedado por um peito pequeno, barriga de barril e coxas de frango, que a continuar assim iria ter. Não estava doente e poderia ter optado pelo exercício se não fosse a minha falta de jeito que me tornava uma palhaça nas aulas de Educação Fisica e me ostracizara socialmente desde a infância. Oh a falta de jeito... mais um defeito que apenas o recurso à fome podia combater.


Venus Evolution

   Vendida a alma ao diabólico estereótipo de beleza e sucesso ocidental, restou apenas um campo em que ainda me desenvolvia, o religioso. As duas lutas cruzaram-se numa busca pela perfeição no meu 10º ano. Como eu nunca me entendia com os esotéricos evitava os seus manuais lendo-os parcialmente (apenas capítulos referentes à roda do ano celta), quando lia. A inspiração e modelos surgiam-me espontaneamente e por vias indirectas como na leitura do romance As Brumas de Avalon e seus subsequentes de Marion Zimmer Bradley, que bebem muitos dos princípios da wicca. Enfim sem mais rodeios em busca de motivação comecei a imitar o jejum das sacerdotizas de Avalon, confiante de que me abriria as portas para a espiritualidade e me faria perder peso.

   Como seria de esperar funcionou, sentia-me mais intuitiva, mais encantadora, mais perto da deusa cujo o símbolo omnipresente era a lua. Mas foi tudo efémero, depois quando fui apanhada pelo ciclo vicioso, ”No food-compusão-No food”, desmoronou-se tudo. Por um lado tentava fazer jejum simplesmente para parar de comer, sempre com a esperança de que a seguir conseguiria normalizar a minha alimentação e parar de engordar. Por outro porque estava convicta que a Deusa só me estava acessível se jejua-se, essa era a única forma que eu tinha de aumentar as minhas capacidades, de me aproximar ligeiramente dos esotéricos natos. Tudo em vão, há medida que o tempo passava os períodos de jejum eram cada vez mais curtos e os de hiper-ingestão mais longos.

   Não engordava significativamente mas também não emagrecia e essencialmente sofria. Convenci-me que estava condenada a ser gorda e indesejada e que era tudo uma questão de tempo. Assim um belo dia decidi que deixaria de ser virgem no prazo de um ano. O acaso trouxe-me um voluntário e eu aproveitei, não quiz saber que tivesse namorada, que fosse intelectualmente desinteressante, que não respeitasse a minha vontade, nem mesmo que apesar de personificar o meu estereótipo de beleza masculina chegada a hora não me excitasse, marquei o dia e fui.
   
    A 19 de março de 2007, o mais próximo do equinócio que se pode arranjar pedi protecção à Deusa e deitei-me com um homem que não conhecia e em quem não confiava. Achava que estava a fazer um rito de fertilidade mas na verdade estava a prestar culto à minha própria presunção e à visão redutora que tinha do meu próprio ser. E se o sei hoje é porque a deusa ou a minha consciência, se assim o preferirem, me disse.
  
   Depois deste 1º contacto tão intenso e profundo digno de qualquer romance esotérico e que me mudou para sempre, fez-se um silêncio da sua parte que me atormentava tanto como a comida. Sem sucesso tentava reaproximar-me, e tentei tanto que certa noite consegui. Andava tão desligada pela doença que só no dia seguinte percebi que a face que brilhava no céu era a anciã e que fora com ela que me tinha encontrado. Na altura a sua mensagem pareceu-me terrível, e entre outras coisas disse-me que não me queria para sua sacerdotisa.

   Fiquei de rastos, andei mais um ano convicta de que não tinha qualquer tipo de religiosidade, pensava que talvez devesse parar de pensar também neste campo, a fim de me conseguir converter ao cristianismo. Mais disparates!!!

   O que eu precisava era de tratar o meu distúrbio alimentar, assim que comecei a melhorar percebi tudo de maneira diferente e a deusa sorriu-me de novo. Hoje gosto de mim como sou! E sei que não há coisas a mudar mas sim a aprender. Tenho ainda um longo caminho pela frente, na verdade vou ter sempre, porque a luta é diária.




   Enfim... sentia-me na obrigação de passar a mensagem. Agora só mais duas informações úteis:

Consulta de disturbios alimentares dos H.U.C.:
http://www.huc.min-saude.pt/psicdisalimentares/index.html

e esta leitura esclarecedora



P.S.: Não considero a obra de Marion Zimmer Bradley Pró Ana ou Pró Mia ou de qualquer outro distúrbio, é apenas uma série de romances que a minha mente doente deturpou

Curas, Benzeduras e Orações Tradicionais

   A nossa tradicional bruxa da aldeia apresenta muitos dos traços definidores de um xamã, curando males do corpo e do espirito como se tratando de um só. As suas orações de cura falam do Deus cristão mas entrelaçam-se com crenças pagãs anteriores que consideradas heréticas pela igreja subsistiram, conduzindo assim a um sincretismo aos nossos olhos contraditório.


    Aqui ficam algumas Curas, Benzeduras e Orações para todos os que se interessam por etnografia ou simplesmente acham graça este entrelaçar do cristianismo com a bruxaria popular.

   Todas a citações de cariz etnográfico foram extraídas de uma mesma fonte que cito no final e terá sido recolhido exclusivamente entre os alunos de Cursos de Alfabetização de Adultos na zona do concelho da Batalha, destrito de Leiria, nos anos 80.

   Um pequeno filme sobre esta temática e que me pareceu interessante está disponivel em:
http://www.memoriamedia.net/central/index.php?option=com_content&view=article&id=69&Itemid=41




Cura dos Meninos Quebrados (Hérnia)

“É feita numa noite de S. João à meia noite por duas meninas e um João.

Abre-se ao meio um carvalho e o João passa o menino pela abertura feita no carvalho dizendo:

- Toma lá Maria.

E ela responde: - Dá cá João.

Ele diz: - Toma lá um podre e dá cá um são.

A outra Maria deve estar junto deles a fiar estopa com uma roca.

Em seguida o carvalho é amarrado com a estopa, unindo as duas partes que haviam sido rachadas e não separadas totalmente.

O carvalho tem de estar de pé. Se ele secar o menino não cura. Se rebentar de novo, cura-se o menino.



Recolhido na Torre (Fev/87)”





Cura do Cobrão



“Herpes Zoster ou Zona ( termo popular "cobrão")

A zona é uma erupção da pele devida à reactivação do vírus que causa varicela (termo popular "bexigas doidas") na infância ou na adolescência. A erupção

aparece em banda de um dos lados do corpo, a área atingida fica vermelha e dolorosa, surtos de vesículas aparecem e rebentam deixando feridas cobertas por

crostas. A dor intensa da zona é devida à inflamação dos nervos da região afectada. A zona pode ser o primeiro sinal de infecção pelo VIH ou de uma

alteração do sistema imune. As medicações anti-virais podem fazer com que a doença se cure mais rapidamente e também aliviar a dor.”



Fonte:

Sociedade Portuguesa de Dermatologia disponivel em http://www.dermo.pt/_script/?id=10&det=48 (08-02-2010)



Cura do Cobrão

“Bicho bichinho

Sapo sapão

Aranha aranhão

Que te faças tão negro

Como este carvão



Recolha feita em Santo Antão (Fev/87)”





“Eu te benzo «serepente»

Com a mão do Omnipotente

Que andes para trás

E não para «deente».

Pai Filho e Espírito Santo.

(não se diz o Amen)



Faz-se isto uma vez nove dias seguidos .

Benze-se com uma palha de alho queimada na chama da candeia de azeite e molhada no mesmo azeite.



[Outra versão]

“Eu te corto cobrão

Cabeça, rabo e coração

Em nome do Pai, do Filho

E do Espírito Santo.



(Nesta oração utiliza-se uma faca em vez da palha do alho.)



Recolha feita na Torre (Fev/87)”





Afugentar o Mal da Casa



“Esta casa tem quatro cantos
Quatro anjos ao meu lado

Afasta-te daqui demónio

Que te estou a expulsar

Em louvor do Santíssimo Sacramento

Tira este mal para fora

Entra todo o bem para dentro.



(Colocar 4 brasas e quatro bocadinhos de alecrim, incenso e mirra, defumar a casa de canto a canto, 4 dias seguidos à noite.)



Recolha feita em Santo Antão (Fev/87)”





Cura da Lua



[Segundo a minha avó se a roupa dos bébés fica exposta ao luar este fica triste e perde o apetite como se estivesse doente, então é necessário rezar esta oração durante nove dias. Será que encontramos aqui uma lua demonizada pela igreja mas irónicamente a conservar o seu estatuto sobrenatural?]



“Ó lua por aqui passaste

A graça da minha filha levaste

Hás-de por aqui passar

A graça da minha filha hás-de deixar

E a tua hás-de levar.



(Quando a roupa das crianças fica estendida de noite na rua)



Recolha feita em Santo Antão (Fev/87)”





Mau olhado



“O Quebrento ou Mau Olhado, consistia em lançar maus pensamentos sobre alguém com quem não se simpatizava, ou por quem se nutria uma certa inveja (mal de inveja).

Uma pessoa notava que estava sendo alvo de um mau olhado quando lhe surgiam no seu dia a dia contratempos, problemas, etc., cuja a origemnão sabia explicar.

Dirigia-se então à curandeira que numa primeira fase via se realmente existia um mau olhado.

Colocava num prato água e pegava num pauzinho (sobreira, oliveira, etc., com uns 10 cm e ao mesmo tempo qua fazia cruzes sobre a pessoa doentes dizia:

. - «Os olhos atravessados

Que te atravessaram

Assim como as palavras do Santo Evangelho são três

Eu me entrego à Santissima Trindade

Ao menino Jesus

E à Santa Bela Cruz»

Estas palavras eram repetidas três vezes sempre acompanhadas com o sinal da cruz. Pegava então no pauzinho e molhava-o em azeite, colocava este sobre o prato com água e deixava cair 3 a 5 pingos de azeite.

Se realmente existisse mau olhado o azeite espalhava-se sobre a água (o que não é normal, pois o azeite é mais condensado [o termo correcto seria denso]e por isso não se mistura com a água). Então para cortar o mau olhado, com o pauzito tocando a água em sinal da cruz dizia:

«Senhora do prado

Tirai este quebranto

Assim como Nossa Senhora

A Seu Bento Filho amou

Eu corto e descorto

Os olhos atravessados

Que te invejaram ou praguejaram. Amen.»

Repetiam-se estas palavras 5 ou 9 vezes (sempre em número ímpar, e sempre acompanhados com o sinal da cruz)

O prato era então limpo, deitando-se o seu conteúdo (água) para o lume ou numa encruzilhada

No caso de Maus Olhados sobre animaiss, a curandeira fazia sobre estes o sinal da cruz ao mesmo tempo que dizia:

«As pessoas da Santíssima Trindade querem e podem

De onde este mal veio ele para lá torne

Em nome do Santíssimo Sacramento

O teu mal saia para fora e o bem entre para dentro.»



Recolha feita em Maio de 1986 com a colaboração da Senhora D. Matilde de Sousa Ligeiro

Rebolaria – c/69 anos”



[Outra versão para o Mau Olhado]



“Linda estrela da manhã,

Que por aqui ando guiada,

É a toda a hora do dia

E a pino do meio dia.

Maus olhos me não possam ver.

Pai Nosso.

Avé Maria.



Recolha feita em santo Antão (Fev/87)”




Cura da Erisipela



"A erisipela é uma infecção dermo-hipodérmica aguda, não necrosante, geralmente causada pelo estreptococo β hemolítico do grupo A. Em mais de 80% dos casos situa-se
nos membros inferiores e são factores predisponentes a existência de solução de continuidade na pele, o linfedema crónico e a obesidade. [...] A penicilina continua a ser o antibiótico de referência, embora actualmente diversos fármacos, com propriedades farmacodinâmicas mais favoráveis, possam ser utilizados. A recidiva constitui a complicação mais frequente, sendo fundamental o correcto tratamento dos factores de risco."

Fonte:
http://www.actamedicaportuguesa.com/pdf/2005-18/5/385-394.pdf (08-02-2010)
 
 
 
“Erisipela, erisipela

Vai-te para o fogo, vai para o mar

Vai-te embora António

Não tenho o que te dar



Pedro foi a Roma

Encontrou o Senhor

O Senhor perguntou:

- Pedro, que há por lá?

- Muita erisipela

muita gente morre dela.

- Senhor com que se curará?

- Com o esparto e a farinha amarela.



Recolha feita em Santo Antão (Fev/87)”





[Outra versão para a Erisipela]



“Pedro Paulo foi a Roma

Jesus Cristo encontrou

E e Jesus Cristo perguntou:

- Pedro Paulo que viste lá?

- Muita morte repentina

E muita erisipela má.

- Pedro Paulo volta lá

E benze a erisipela má

Com a corda de esparto

E o óleo de oliveira

E a erisipela má secará

E essa gente viverá.

Pai Filho e Espirito Santo.

Alha-se bem o azeite e polvilha-se com farinha de milho.

Embrulha-se com um pano pois quer muito agasalho.



Recolhido feita na Torre (Fev/87)”





Cura do Aguamento



“É feita a crianças pequenas que começam a ficar magrinhas definham, pedem e querem tudo e nada comem.

Ficam pálidas e o cabelo não assenta na cabeça, «andam com o cabelo em pé».

Pede-se um bocado de carne gorda a uma pessoa amiga, com a qual se fazem nove bocadinhos, um para cada um dos nove dias que dura a cura.

Vão-se guardando num saquinho todos os bocados e no fim dão-se a um cão preto.

Com um dos pedaços esfrega-se a espinha da criança debaixo para cima e faz-se uma cruz com a carne ao começar e ao acabar, nove vezes seguidas dizendo:

«Do aguamento te vou curar

Com toucinho velho te untar

Para a um cão preto te dar

Senhora do Livramento

Cura este menino/a do aguamento»

No fim reza-se o Pai-nosso.



Recolha feita na Torre (Fev/87)”





Espinhela Caída



"A espinhela caída seria uma doença caracterizada por dores no estômago, costas e pernas, acompanhadas por extremo cansaço. A espinhela corresponderia à extremidade inferior do esterno, o apêndice xifóide, e seria definida como um pequeno osso, flexível, situado na boca do estômago."





“CAUSAS – Grandes esforços realizados, quedas, maus jeitos dados

sobre uma parte do corpo, tinham como consequência

vómitos, falta de apetite e mal estar.

Dizia-se que estava desmanchada

Com as mãos untadas de azeite, a curandeira ia amaciando o estomâgo numa massagem lenta e ritmada.

- Em crianças, depois da massagem o estômago é apertado com papel pardo e um pano envolto à cintura.

A massagem é feita durante três dias seguidos e nos 4 ou 5 dias seguintes deverá a criança estar em repouso.

- Em adultos é feita a massagem e agarram-se os dedos das mãos e dá-se-lhes um puxão mais para baixo, levantando-se bem os braços de forma a ficarem paralelos na verticar.

Massageia-se novamente e aperta-se o estômago com um lar de pão oi então com um pano embebido em alcool, isto em volta da cintura de modo a apanhar o estômago. São feitas estas massagens durante três dias seguidos e nos nove dias seguintes é recomendado repouso absoluto.



Emília Vieira Alexandre – 68 anos

Rebolaria”





ENTERITE: Para curar a enterite, fazia-se um creme que era aplicado junto ao umbigo. Para esse creme era utilizado Giribão (erva) e uma clara de ovo. Estes dois ingredientes bem misturados eram então aplicados na cura da enterite.



Emília Vieira Alexandre – 68 anos

Rebolaria”





Cura do Bucho Encostado



“[Pode ser provocado por queda ou mau jeito dado a crianças pequenas.

Provoca diarreia, vómitos e a criança fica amarela e com os olhos encovados.]

Deita-se a criança no chão. Tenta-se unir os dedos polegares das mãos, (isto com os pés bem unidos e com uma pessoa a segurar). Se os dedos das mãos unirem está bem. Se os dedos não unirem está escangalhado. Vão-se levantando os braços da criança para cima, ficando perpendiculares ao corpo.

Então concerta-se o «bucho», puxando para cima, com jeito.

Frita-se um ovo, coloca-se num papel pardo com um paninho por cima e põe-se isto na barriga da criança. Liga-se com uma fralda ou ligadura.

Terá de andar asssim três dias. Passados os três dias tira-se o ovo e a criança está boa.

Hoje já não é usado o ovo mas sim azeite.



Recolha feita na Torre (Fev/87)”



Bibliografia: 

D.G.A.E.E. – Batalha. Subsídios Para a Cultura Popular do Concelho da Batalha, s. l. ed. Câmara Municipal da Batalha