sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Culinária Mágica no Catolicismos Português


A receita que se segue é confeccionada todos os anos pela minha mãe para o dia de todos os santos. Apresento-vos aqui os ingredientes, gestos e palavras que a observei repetidamente fazer e que como vão constatar tem um lado supersticiosos bem vincado.


Bolinhos dos Santos
(bolinhos de farinha de trigo)

Ingredientes

3kg de farinha (com adição de fermento)

1,2kg de açúcar

Raspa de 4 a 5 limões

7 ovos

1 noz de fermento de padeiro dissolvida em água morna

2 colheres (sopa) cheias de margarina

Água com sal, mel, canela e erva doce, passas e nozes a gosto

Uma chávena (café) de azeite quente



Modo de confecção

Mistura-se numa tigela a farinha, o açúcar e a raspa dos limões, canela e erva doce.

Abrem-se 4 buraquinhos e despejam-se os ovos batidos no 1º, a água com sal no 2º, no 3º as 2 colheres de margarina derretidas, e no 4º o fermento dissolvido. Começa-se a amassar, junta-se o mel e retempera-se de especiarias, sempre com uma tigela de água por perto que se deve adicionar se a massa apresentar grumos.

Quando estiver tudo bem envolvido e temperado rega-se a massa com o azeite quente. Neste momento a massa deve começar a desprender-se das bordas da tigela. Juntam-se então as passas e as nozes.

Traça se uma cruz na massa e reza-se a seguinte oração “Em louvor de São Miguel e S.Simão acrescente em massa o que acrescentou em grão” e em seguida cobre-se então com calças de homem “barrasco”.

Deixa-se levedar 90 minutos resguardado do frio e vai a cozer em forno bem aquecido.

PS: Quem sabe uma fonte de inspiração para confecções no próximo sabbat.

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

A vida e a morte e toda a lógica da cadeia alimentar



Há quase dois meses que sinto vontade de escrever isto e apesar de achar que a maioria das pessoas já ouviu falar desta prática continuei a sentir o impulso. Então cá vai...

O chamado "enterro celeste" é um rito funebre tradicional no budismo tibetano, em que o cadáveres são expostos ao ar livre desmembrados.

Do ponto de vista funcionalista a prática terá surgido devido à escasses de madeira na região para proceder à cremação que fica assim reservada aos guias espirituais. O enterramento por seu lado seria reservado a criminosos e vitimas de doenças.

Já do ponto de vista cosmológico a prática faria sentido na medida em que, após a realização de um ritual que auxilia a libertação de toda a consciência do individuo do seu corpo e a sua "transferência" para outro plano, o corpo perde qualquer utilidade. É então, num acto de generosidade, deixado à disposição de outros seres vivos para que dele se possam alimentar.

É esta ultima ideia que faz todo o sentido para mim. Desde pequena que me faz uma certa confusão a obsessão com que se arranca toda a santa ervinha nascida nos cemitérios portugueses. Não sei e não tenho pressa em tomar posição na eterna discussão em torno do que acontece ao espirito/consciência ou lá o que seja, depois da morte do corpo. Só sei que vou sempre sentir saudades dos amigos que morreram e que me anima saber que no universo "nada se perde, tudo se transforma".

Apazigua-me muito mais pensar que aquelas ervinhas em torno da campa de um ente querido têm parte de si e que florescem graças a si, do que qualquer outra ideia sobre eterno descanso ou reencarnação. Sem dúvida que prefiro pensar que ele agora se dividiu e faz parte de um todo maravilhoso que é o universo e a vida. E só gostava de ter conseguido explicá-lo aos corações destroçados com os quais me cruzei.

Além disso há aqui uma questão de justiça, se ao longo da nossa vida nos alimentamos de outros seres vivos parece-me muito bem que outros seres vivos se possam alimetar de nós também. Por questões sanitárias o "enterramento celeste" é posto de parte, mas porquê o horror às ervinhas? Porque não semear aí mesmo as flores que tanto gostamos de aí depositar?